terça-feira, 24 de julho de 2007

O certo e o também certo

Hoje em dia, cá em terras tupiniquins, todos estão certos. Todos são donos da verdade. Todos têm razão.
Não há mais o certo e o errado, que havia no tempo das vó. E isso começa cedo. As crianças já são educadas sem possuir essa visão, já que podem fazer o que bem entendem e não podem ser punidas. Que horror dar umas palmadas num pirralho mal educado. Ensinar respeito é impossível, aquela velha regra do "não faz pro outro o que tu não gosta que façam pra ti" há muito não vale. Cada um faz o que bem entende. E todos estão certos.
Isso acontece em absolutamente todas as escalas, todas as castas, todas as cidades, campanhas, bocadas, favelas, fubangas. Exemplos? Não seriam suficiente vinte páginas de texto... mas vamos lá.
1) Nas favela: Vale a lei do mais forte (atualmente reconhecido pelo que tem o maior fuzil e mais balas), é como no far west americano. O "certo, mano" é o traficante com mais discípulos da vez. Até ser morto pela concorrência. Aos pobrão que precisam ou que moram por escolha na favela lhes resta concordar com o "certo, mano". Às vezes a polícia faz uma megaoperação e mata meia dúzia de café pequeno, para aparecer bem na imprensa falada-escrita-televisionada e para convencer aqueles de mente curta que o governo "otoridade" ainda se importa com alguma coisa.
2) Na tua casa: Aquele teu priminho de 8 anos faz o que bem entende. Sabe mais que tu em qualquer assunto (principalmente computador, internet e putaria). Contesta sempre. A adolescência hoje chega aos 9. Basta ver como as meninas se vestem e do que elas falam. Agora tenta explicar o certo e o errado... Seu maldito abusador de crianças, onde já se viu um homem desse tamanho dar uma palmada numa inocente criança indefesa??!?!??!??!
3) Na rua: Aí sim que é divertido. Nas grandes cidades, hordas de macaquitos autômatos se acotovelando e esbofeteando para "ser mais rápido", "chegar primeiro", "ocupar seu espaço", "fazer a diferença". Diferença? Que tal perceber a diferença entre o certo e o errado primeiro?? Mas que errado?? Errado são os outros, eu é que tô certo!! Não importa se é o carroceiro que inventou de passar com uma roda por cima da calçada e acertou um véio e quebrou os espelhos de quem tava na rua, o motoqueiro que ultrapassou pela direita e bateu em outro que estava parado entre uma kombi e uma besta (a van, só pra deixar claro) ou o motorista de ônibus que saiu do corredor pra ultrapassar outro e bateu na traseira do teu carro. Todos estão certos, todos "precisam" fazer aquilo, não importa a conseqüência. Conseqüência? O que é isso mesmo?
4) Na política: Como já postei aqui antes, não há mais limites nesse campo. É simples, o certo é: ou tu rouba mesmo, (descaradamente, cagando e andando, enterrando selos, metendo dinheiro na cueca, ligando pro irmão do presidente, comprando o senado, desviando milhões, construindo pinguelas que custam como pontes marítimas, etc.) ou tu faz vista grossa (ingênuamente, não sabendo de nada, abafando investigações, fazendo pizzas, dançinhas ou choradeiras na tv, etc.)
5) Na campanha: Lembra da fábula da formiga e do gafanhoto? É o fiel retrado da economia primária brazzzileira. Quem tem as megapropriedades do tamanho de estados inteiros não se importa, pois está intrínsecamente certo, tem seu deputado compradinho e seus capatazes armados. Quem tem médias e pequenas tá com o cú na mão, sempre temendo a invasão dos gafanhotos, mas sempre certo de que isso não vai acontecer e que as pessoas são boas e "trabalhadeiras". Os gafanhotos tão aí é pra zoar. Entrar, quebrar tudo, acampar, matar quem falar contra, ganhar coisas de graça e depois vender pra partir pra próxima. Tudo que é de mão beijada é mais gostoso, já que não é teu mesmo e tu pode conseguir de novo. Isso é o certo?? Claro...
6) No teu mísero trabalho: Aquele no qual tu vai passar tua vida confinado, sem ver a luz do dia, ouvindo idiotices de gente muito inteligente, letrada e versada em todo e qualquer assunto, que se acha a última bolacha traquinas do pacote e fazendo tarefas estúpidas e automáticas, até que um belo dia o teu patrão estrangeiro decida que os indianos fazem a mesma coisa que tu e custam a metade e te dê o pé na bunda. Mas não te preocupa, afinal tu tá certo em trabalhar a vida inteira e vai ser recompensado no final, com uma gorda e feliz aposentadoria. Nada mais justo e certo.
Chega. Afinal já defendi o "meu certo". E tou cagando pra quem não concorda! Mas quem não concorda também se acha certo. Está certo. Todos estão certos.
Fechando, transcrevo um trecho de uma conversa com um amigo desaparecido, anos atrás:

- É meu amigo, quando os cardumes estão descendo a favor da correnteza e tem um ou outro peixe tentando subir o rio, quem está errado?
- O rio...

quarta-feira, 18 de julho de 2007

O sentido da vida - A era do descartável

Domingo morreu um colega. Não era meu amigo, apenas um cara que sentava dois metros para a esquerda. Perdeu para o câncer. E para a era do descartável.
Ele usava copos descartáveis, vestia roupas descartáveis, tinha quinquilharias eletrônicas descartáveis, andava num carro descartável. Ele era descartável. Assim como todos, por pior espécime que seja, no dia do seu funeral foi canonizado. Virou santo, instantâneamente. Todos aludiam e valoravam suas atitudes. Era um bom colega. Era um bom amigo. Era um bom profissional, marido e pai.
Mas era descartável.
Segunda-feira veio alguém do depto. pessoal [SIC] e juntou as coisas de sua mesa. Ponto. Fim da história. Pode passar o próximo, por favor? Apesar de todas as suas virtudes, será facilmente substituído, por outro igualmente descartável - mera peça da máquina que move a nossa era. A era do descartável.
Como tudo nesta era, a cara virou lixo. Expirou. Não produz mais. E foi descartado. Foi empilhado em prateleira de concreto, o último apartamento, como milhares, milhões de outros. Agora é apenas mais um estorvo, ocupando um precioso espaço, assim como todo e qualquer descarte produzido às toneladas pela era do descartável. Lixo. Tóxico, nuclear, industrial, hospitalar, doméstico, reciclável, não reciclável, poluente, infectante. Lixo humano.
Segunda-feira foi um dia como tantos outros. Apenas jogou-se fora uma pequena peça descartável. Isso não causa impacto. Ninguém realmente se importa. Não tem valor, pode ser facilmente substituído. Todos seguem suas vidas automatica e normalmente, como boas engrenagens, que ao mesmo tempo produzem, consomem e são consumidas pelo processo.
Mas e o processo? Seria também descartável?
Provavelmente. Em termos históricos, durará pouco tempo. Infelizes daqueles que viveram e compactuaram com tal barbárie. Seremos execrados no futuro. Bárbaros! Irracionais! Isso se ainda existirmos enquanto espécie, se sobrevivermos a esta era.
Mas por agora sigamos no processo. Temos que ter cada vez mais coisas. Coisas que duram cada vez menos. Não há tempo a perder com tolices, como as verdadeiras relações humanas, a liberdade, a introspecção, o pensamento, a vida. Eu mesmo vou imediatamente parar de produzir este lixo literário e voltar aos meus milhões de linhas de código, tão imprescindíveis para mais um produto descartável da nossa era.

O Brazzzil do ano dois mil (e a infra dos anos cincoenta)

O Brazzzil do ano dois mil (e a infra dos anos cincoenta)

Depois do zilionééééézimo acidente no campo de pouso de Congonhas, um dos quais morreu mais gente, não posso perder a deixa de inutilmente blogar sobre a infra-estrutura da varonil nação brazzzileira.
Apesar de tu, caro inútil, juntamente com todos os inúteis que tu conhece, pagarem PETILHÕES de dólares por ano em impostos, contribuições compulsórias, direitos de passagem, propinas, gorjetas, pedágios, taxas, comissões e mais todos os sinônimos que tu consiga pensar, parece que nunca é suficiente, nunca sobra um trocadim pra retornar em forma de benesses para a corja...
A infra-estrutura nessa bosta não muda desde os anos 50. Cinquenta anos de impostos PARA QUE?? As nossas estradas são 90% as mesmas - sim, pasme, caso tu ainda seja capaz disso - 90% as MESMAS que já estavam aí quando o teu pai (ou vô) pilotava loucamente o seu Simca Tufão a mil por hora (hmmm... nesse caso 1000 = 80) ouvindo um Robertão no rádio AM nas curvas da estrada de Santos. Salvo raríssimas exceções de pequenos e muito específicos trechos, as estradas são as MESMAS.
As ferrovias sim, estas definitivamente não são mais as mesmas. Que maravilha a infra-estrutura ferroviária do nosso país, com trens modernos, estações confortáveis, preços acessíveis... OPS!!! Errei de país. Mesmo assim, as ferrovias não são definitivamente mais as mesmas. Elas não existem. Cinquenta anos atrás, nosso amado governo militar começou o processo de destruição da malha ferroviária, em benefício às grandes petrolíferas, montadoras de carros e fábricas de pneus, gentilmente atendendo as delicadas solicitações dos gringos.
Os aeroportos também são os mesmos. As pistas são as mesmas. Os equipamentos são os mesmos (mentira!!! agora são muuuuito superiores, pois foram comprados os restolhos que para os gringos não serviam nem como sucata há 50 anos). A quantidade, o peso e o tamanho das aeronaves, esses sim são de século 21. Agora tu aí e o resto dos inúteis reclamam do "apagão". Agora as TVs vão gritar um mês por causa deste acidente. Qual a novidade? Até que é pouco a quantidade de merda que acontece por aqui!!!
Os portos são os mesmos. A capacidade de embarque é ridícula. Teratoneladas de gãos (só um exemplo) se perdem, apodrecem, vão para o lixo - isso mesmo, para o LIXO, depois de plantados, adubados, desinsetizados, colhidos, armazenados, transportados de caminhão nas nossas maravilhosas estradas até o porto marítimo mais próximo - por culpa da falta de capacidade logística dos portos brazzileiros. Portos fluviais, que existiam nos anos 50, simplesmente não existem mais. Idem ao explanado sobre as ferrovias.
Então eu estou errado. O título deste post está incorreto, pois a infra dos anos dois mil É PIOR que a dos anos cincoenta, até em dados absolutos (nem vou fazer uma análise relativa...) Parabéns à nossa grande nação e aos inúteis que nela abundam!! E rumo ao século 22!!!