quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

O que você quer ser quando crescer?

Minha mãe conta, do tempo quando eu era pequeno, que, ao ser questionado por algum loser (essa pergunta é típica do parente loser - aquele tio "encostado" pelo INAMPS, aquela tia véia solteirona ou mãe de um inútil vagabundo e/ou boleteiro, etc.), eu sempre saía com a seguinte resposta: "Quero ser doutor, ter um escritório num andar bem alto e uma secretária loira."

Passados quase trinta anos dessa época, posso ver que minha resposta em nada se parece com a situação dos dias de hoje. Embora eu não seja vagabundo nem boleteiro, meu inocente projeto de vida não foi concretizado. Por quê? Não sei responder pois não consigo perceber ao certo onde exatamente eu errei. Talvez em muitas ocasiões, talvez em nenhuma, talvez esse plano utópico não fosse mesmo para mim.

Então, em alusão ao post anterior, intitulado "Vale a pena ter filho!", do caro inútil Petrvs, narrarei, em dois capítulos, a história do único filho do meu pai, a ser usada como referência do que não fazer com seu descendente e já deixando a sugestão estender-se a outros amigos grávidos ou pensando sobre o assunto paternidade.


Capítulo I
Onde eu cheguei

Eu moro atualmente numa remota cidadezinha da região da campanha, esquecida pelo mundo e pelo tempo, na qual vim pela primeira vez mais ou menos nesta tal época da minha inocente resposta à pergunta fundamental do post. Não tenho claramente na lembrança o ano, mas posso afirmar com certeza a década: os famigerados oitentas. Hoje, passadas praticamente três décadas, tudo é exatamente como antes: as pessoas ainda sentam nas calçadas para conversar à tardinha no verão, as crianças ainda correm descalças, andam de bicicleta e brincam até a noite pelas ruas, o casario velho e mal cuidado ainda é o padrão de moradia, as lojas e empresas familiares ainda estão sob comando das mesmas famílias, o rio ainda enche boa parte da cidade com qualquer meia dúzia de dias de chuva, os sítios e fazendas ainda produzem os mesmos produtos da mesma forma primitiva de agricultura, os aposentados seguem como maioria, os jovens que querem prosseguir com os estudos continuam precisando se deslocar até a "cidade grande" mais próxima, o quartel do exército continua sendo o maior empregador da cidade, os funcionários públicos ainda são a maioria absoluta da workforce, as estradas para as cidades vizinhas ainda são estreitas e mal conservadas, os restaurantes permanecem servindo somente a tradicional comida caseira e o churrasco, a clientela dos antigos bolichos ainda são os fétidos velhos bêbados, as indústrias ainda não chegaram, a grande promessa a cada eleição ainda é o desenvolvimento da região, a operadora da telefonia permanece a mesma e única desde a época dos cinco dígitos, as ruas continuam calçadas pelas mesmas pedras e os remendos ainda formam quebra-molas às vezes piores que os buracos, as carroças, bicicletas e motonetas se mantém como o principal meio de transporte, enfim, toda essa longa lista de exemplos serve apenas para dizer que nada mudou.

Estou desempregado desde que fui demitido há cerca de seis meses e vim de mala e cuia com minha amada esposa para cá, por obrigação do seu trabalho. Não tenho perspectiva de arrumar um emprego na minha área de especialização por aqui, já que a indústria ainda não chegou e o setor de serviços se resume ao simples do básico do indispensável. Na verdade, não tenho perspectiva nem vontade nenhuma de trabalhar aqui. Não há "cidade grande" em um raio de 150km e esta mais próxima só pode se orgulhar de ser grande em quantidade de habitantes. Mesmo nessa "cidade grande", minha área profissional praticamente não existe; as poucas possíveis vagas se resumem à meia dúzia de empresas (sim, 6 é a quantidade exata, não apenas uma aproximação) e só abrem por milagre ou total falta de noção (leia-se exigências descabidas) dos recrutadores.

Vivo (ou seja, pago as contas) graças ao salário de merreca da minha esposa e mais umas míseras economias juntadas pelos meus pais nas épocas de vacas gordas. Podem me atirar pedras, tijolos, paralelepípedos e rochedos, mas a época mais farta da minha vidinha de classe média foi a da famigerada inflação galopante, ou seja, a era pré-Collor (desenvolverei esse assunto em um próximo post). Meu seguro desemprego já acabou, pois nosso grande governo trabalhista acha justíssimo dar R$ 870,01 por cinco meses para quem trabalhou (e contribuiu proporcionalmente) nos últimos cinco anos com rendimentos acima de 4 mil, enquanto oferece quase o mesmo (um salário mínimo, atualmente em R$ 510,00) para familiares dos presidiários, pelo tempo que o ente permanecer na cadeia.

Por força desse mesmo governo trabalhista, decidi adotar a velha máxima "se não pode vencê-los, junte-se a eles" e virei concurseiro. Pretendo passar os próximos tempos estudando e fazendo os concursos melhores ou mais adequados à minha profissão, até que passe em algum que realmente valha a pena. Me preocupa muito, todavia, esse ano de eleição, tanto pela pausa legal obrigatória de seis meses nos processos seletivos públicos, como pelo desconhecimento de quem será e qual postura a respeito adotará o governo eleito. Essa preocupação é amplificada devido a um dado recente que indica um total de 40% da workforce do nosso Brazzzil varonil prestando serviço diretamente aos órgãos públicos (resultado da política trabalhista-socialista-disfarçada-de-neo-qualquer-coisa dos últimos dois governos do PT).
Fechando o capítulo, considero caracterizada minha situação atual, fora alguma depressão, tiques, anginas, ataques de fúria, estresses involuntários e preocupações que não valem a pena mencionar. Por motivos de formato bloguístico, o capítulo 2 segue no post de amanhã.

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